terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Tropicália Café


Acaso do destino seria encontrar-te aqui. Dizem os entendidos - de entendidos nunca temos falta, são como os ignorantes, muitos a falar de muita coisa sem dizer coisa alguma - dizem os entendidos que amanhã vai chover. Eu, por mim, continuo na minha: amanhã chove se Deus quiser, e se o Altíssimo achar que vale a pena chover, choverá, caso contrário bem que podemos levar todas as gabardines que nem por piedade fará Ele chover.

É o mesmo com este café. Seja mesquinho o destino e passas ao lado, continuando para onde quer que bem te apeteça, seja traiçoeiro e entras por essa porta dentro, ou vês-me deste lado do vidro, como que não quer a coisa estando eu aqui, e berras e uivas, que razão a minha de aqui estar, deliberadamente prostrado.

Eu nada, menina, nada. Nada? Nada.

Menina senta-se na cadeira minha defronte.

Não acredito. Não? Não, vieste cá por alguma razão, qual não sei, mas alguma haverá de ter sido. Vim ver a vista. Não, estás a mentir. Pois estou... alguma coisa desejas? Desculpa? De comer ou de beber. Não, estou bem. Isto é um café. Realmente, então um bolo. Qual? Não sei, um bolo. Um rissol aqui para a menina, se faz favor. Rissol? Não era? Não, eu queria um bolo. Tu não querias nada, lembras-te?, pediste o bolo por cortesia. Pois, mas mesmo assim era um bolo, não um rissol. Não desperdicemos um bolo. Que queres dizer? Se não queres tu o bolo que não pediste, quero eu o rissol que me pedi. Ligeiramente abusador. Nem por isso, fica a cortesia paga e o meu apetite saciado. E eu? Tu que nada queres, nada tens.

Momentos de silêncio, veio o bolo. Era um rissol. Desculpe. Veio o rissol.

Que vieste cá fazer? Comer um rissol. Antes disso. Nada. Mentes outra vez. Pois minto. E então? Ver-te. Não sabias que viria. Também não sabia que comeria um rissol. É de quê? Carne picada. Bons são os de camarão.

Partido o rissol e meio é a partilha inevitável.

Não quero obrigada. Foste tu que o pediste. Não era para ti? O meu apetite sacia-se com pouco. Ainda bem que não pediste o bolo. Porquê?

Não respondeu menina. Acabou o rissol e levantou-se.

Fica. Não posso. Onde vais? Não sei. Que vieste cá fazer? Nada. Mentirosa. Pois sou.